Embora tenhamos cada vez mais festivais internacionais (Tomorrowland, EDC, Sónar, Ultra) e eventos de vários portes de forma regular, clubs em quantidade por todo Brasil, e nomes de sucesso como uma nova geração de artistas como Alok e Vintage Culture, cara de uma nova geração em avanço.
A realidade nua e crua é que o resto do mercado dos DJs brasileiros vive uma sombra acentuada de dois anos para cá.
Estes artistas da nova geração estão com faturamentos líquidos mensais individuais com mais de três digitos, seus agentes ficam em média com 20% a 40% do faturamento líquido dependendo do contrato.
Esses artistas viajam com jatos fretados e outras mordomias dignas de Rockstars para cumprir suas agendas pondo o Brasil no letreiro da cena mundial onde outros nomes também detém essas regalias para poderem se apresentar.
Vários fatores influenciaram para um declínio da cena brasileira empobrecendo alguns DJs que tiveram seus rendimentos mensais diminuídos e outros em situação de “aposentadoria forçada”.
Entre os fatores estão: a situação econômica do Brasil que faz com que contratantes diminuam ou até encerrem as contratações e optem por atrações locais mais baratas e sem despesas (como aéreos e hotéis que também tiveram alta de preços), o Funk N Rio e o Sertanejo que pegaram de assalto dias que eram dedicados ao eletrônico em casas noturnas essencialmente até então eletrônicas, derrubando um dia da semana (sexta ou sábado) ou até mesmo tirando o som eletrônico da casa.
Junte a isso o fator de muitos donos e promoters de casas noturnas trocarem noites mais conceituais que rendiam dinheiro, pela moda do Funk N Rio e Sertanejo, ganhando mais dinheiro, mas em detrimento a médio e longo prazo de uma continuidade até do próprio empreendimento com o eventual final da moda desses estilos.
Além disso a burrice e chatice de uma sonoridade musical mais pobre e mais comercial deflagrada por alguns poucos nomes do Brasil, a tal E.D.M. (que começa a levar socos por ser um som que cansa dentro dos clubs e festas – o público em alguns locais percebeu e foge desse programação), já estando em baixa e pondo nomes como FTAMPA, Marcelo CIC com datas minguadas no Brasil, mas bem posicionados no mercado internacional onde tocam em grandes festivais como o EDC nos Estados Unidos e México além de clubs.
Estes parecem continuar com a célebre frase de Tom Jobim de que o caminho da música brasileira é o aeroporto (que digam Gui Boratto e Marky que continuam fortes no exterior e de agenda cheia).
Surgiu também o um tal de “Brazilian Bass”, na verdade um PsyTrance de ritmo mais lento, só não enxerga quem não quer ou mesmo quem ignora e tenta embutir isso como uma moda nascida no Brasil; outros ainda na audácia (ou achando que todos engolem essa), dizem vir do mercado internacional.
Essa sonoridade nada tem de globalizada.
Seria o tal “real brazilian electronic sounds”?
Se sim, o ponto é positivo por termos criado uma sonoridade genuinamente nova, até então o Funk in Rio (apoiado por artistas mundiais de calibre como David Guetta, Diplo, Hardwell, Skrillex), é a nossa cara do eletrônico nascido aqui, a festa do Rio Music Conference no RJ no Carnaval mostrou bem isso numa atitude corajosa e louvável dos produtores do evento que enxergaram o estilo e o inseriram num evento importante da música eletrônica no Brasil.
Até mesmo o público tem culpa da música eletrônica estar numa crise (real!), onde o interesse por musicalidade e atrações diminuiu, e ainda uma tendência mundial denominada Millenials (que chegou ao Brasil), já com pesquisas comprovadas feitas inclusive pela BBC inglesa, apontam que o público esta abandonando o hábito de ir a clubs trocando isso por reuniões de amigos ou bate papos num café.
Marcas de bebidas viram seus lucros diminuírem também e acabam rompendo contratos com os clubs e apostando em eventos que muitas vezes não tem a música eletrônica 100% como foco e misturam ritmos como Rock, Samba, e até MPB.
DJs também pesaram nos prós e contras de seguir modismos musicais que não são garantia de permanecer no mercado ou faturar mais ou menos.
Alguns em jogadas de marketing mal pensadas ou sem acompanhamento de empresário (manager) acabaram implodindo suas carreiras e desaparecendo por completo, e outros não se atualizando num mercado que assim como rock e pop agora precisa de uma nova figura DJ.
Há nomes no mercado (incluindo grandes nomes e até pioneiros), que tocavam até oito vezes mensais, ou seja duas vezes (sextas e sábados) por semana, e hoje tocam quatro datas ou até menos, incluindo uma dolorosa queda de valores de cachets.
Mesmo para leigos ou fãs, basta entrar nas redes sociais de vários artistas brasileiros e visualizar que muitos passam até finais de semana seguidos longe da arte de tocar e que há poucos meses atrás estavam num ritmo maior.
Outro fato são as listas de discussão dos próprios DJs nas redes sociais e watts app onde uma grande maioria reclama da queda do mercado, repito inclusive nomes grandes.
Resumindo muitos tiveram de apertar o cinto ou até mesmo abandonar a profissão de forma forçada para terem o que comer inclusive.
Tudo isso faz com que a música eletrônica apesar de um glamour (falso em sua maioria), transpareça que o mercado vai bem, gera faturamento para todos (e olhem que o DJ seria peça fundamental nesta cadeia não?!), passe por um dos piores momentos desde o final dos anos 90 onde aconteceu um estouro do segmento e que consequentemente evoluiu principalmente nos eventos, além desenvolvimento de profissionais.
No entanto 95% da renda que gira em torno do segmento concentra-se nas mãos de produtores de eventos (muitos amargando prejuízos e saindo ou diminuindo o ritmo, antes da crise financeira do país), muitos desaceleraram o compasso antes mesmo da crise econômica.
Com a alta do dólar que deixa atrações internacionais mais caras e até inacessíveis para muitos produtores mesmo com patrocínios é a hora de uma revalorização dos artistas brasileiros pelos organizadores de eventos, e também para uma rearticulação dos próprios DJs em melhorar sua imagem, em visualizarem novas formas de apresentarem-se.
Ser um DJ jamais se resumiu a saber somente “tocar e mixar”, e sim a se comportar e a se relacionar com o mercado, muitos pecam vivendo numa casca de ovo, ou num degrau onde se acham maiores e melhores que outros mas que no fundo não se auto-ajudam.
Ficam aqui duas perguntas para os DJs se fazerem:
. onde estarei nos próximos 5 anos?
. o que fiz hoje por mim e pela minha carreira?
Para o mercado seria uma bora hora de repensar o próprio futuro.
Para os DJs encarar uma realidade de que a carreira não é eterna, é preciso fazer um pé de meia, ter outros negócios em paralelo a suas carreiras (realidade inclusive de estrelas internacionais que investem seu dinheiro em outros negócios).
No Brasil alguns DJs como Rica Amaral (ex-proprietário da XXXperience), foi um dos que soube investir o dinheiro que ganhou como DJ desde o início de sua carreira, tendo imóveis e até mesmo sendo sócio de um restaurante em São Paulo.
O DJ Gabo também abriu uma bela padaria diferenciada num dos bairros mais badalados de São Paulo, só para citar dois exemplos que investiram em outros segmentos além da carreira.
Rica Amaral e Maumau são alguns de uma geração mais antiga que ainda mantém uma agenda cheia, até pelas suas características musicais que nunca seguiram modismos e ainda tem nichos no país que a consomem.
Outra questão são os patrocinadores para o segmento que mesmo vendo eventos de todos os portes ainda são acanhados em investir em algo que se profissionalizou pelo menos na última década.
Na realidade a cena de música eletrônica brasileira tem apenas um único grande patrocinador, a cerveja Skol, que deslanchou criando uma plataforma louvável e acertiva de marketing em torno de sí na música eletrônica, criando inclusive uma linha de novas bebidas provando que para ela vale a pena continuar investindo.
Mesmo a Skol ainda deixa alguns eventos e veículos do segmento também acertivos fora da sua programação.
A Heineken lançou uma campanha internacional focada em consumo responsável e deve extender ao mercado brasileiro movimentando a rivalidade comercial das marcas. É uma vergonha para outras marcas e seus departamentos de marketing ainda não terem visualizado de forma correta ou se interessado com mais afinco pela cena que tem um público de todas as classes de consumo.
Talvez também pelo nosso mercado ainda carecer de números mais realistas e pesquisas mais sérias sobre o segmento, o que se vê nas pesquisas são apenas números de movimentação de eventos e cachets de artistas, tudo muito vago, sem mostrar abertamente como os dados foram coletados e por quem, matérias plantadas e artigos duvidosos ainda ajudam a desnortear e confundir os departamentos de marketing das empresas, que nada tem de otários.
Essas empresas inclusive procuram veículos como a DJ Sound e Mixmag, numa consultoria de anos, para saberem mais sobre este público de música eletrônica, esses veículos agora partem para pesquisas de mercado próprias desenhando um panorama que ajude as marcas.
No Brasil eventos que cresceram e se profissionalizaram como o festival XXXperience, dos empresários Edson Bolinha e Erick Dias, ainda não tem o respaldo merecido de patrocinadores, ao completar 20 anos do evento neste ano e percorrendo o país com uma tour comemorativa por várias cidades, ainda levam o amor no peito e persistência, apesar do renome, público e consumo que movimentam.
Nos próximos meses devem se confirmar o cancelamento (e reagendamentos), de dois grandes festivais internacionais de música eletrônica no Brasil ao menos para 2016, e com a perspectiva nebulosa da economia pelo menos até final de 2017, onde dados apontam uma lenta recuperação o cenário não é dos mais promissores.
E ai, é onde vão se sobressair os estrategistas, empreendedores e corajosos que, ainda, apostam em nossa cena, novamente uma boa oportunidade para os talentos brasileiros, núcleos novos que vão surgindo de norte a sul do Brasil.
Ao meu ver, o segmento musical esta duelando consigo mesmo entre mortos e feridos, acredito ainda que seja um ciclo a ser superado e que também foi atravessado por cenas em outros países.
No entanto os “los Hermanos” argentinos caçoados pelos brasileiros pela richa futebolística ainda vão remando forte com clubs cheios, festivais, apesar de uma economia interna capenga, mostrando que não é só dinheiro, mas sim cultura e interesse de empresários e público que movimenta o negócio e cena local.
A luz do fim do túnel parece estar desta vez distribuída para mais pessoas resolverem, do público a empresários e até dos próprios DJs que precisam se unir mais como acontece em outros países ao invés de se cumprimentarem num cinismo, se dizendo amigos e chegando até mesmo nas redações das revistas metendo pau nos outros logo depois dos “amigos” saírem pela mesma porta.
Até chilique se aguenta quando tais nomes não querem sair em fotos na mesma capa com outros nomes do mesmo empresário e agência.
Na gringa, várias revistas saem com diversos artistas ao mesmo tempo na capa independente dos estilos musicais que praticam.
Falta ainda uma questão sería que é investir e aculturar as novas gerações de artistas que vão movimentar a cena brasileira num futuro (que é agora), a única iniciativa existente no Brasil é o Rio Music Conference que cumpre um papel fundamental, mas não é só esse trabalho que pode fazer a diferença a exemplo de outros países como Alemanha e Holanda, principais celeiros globais do segmento musical.
Hipocrisia generalizada criando um futuro sombrio neste momento.
Mas todos temos umbigo!
by Gonçalo Vinha