Um voo há muito tempo esperado. Desejado, planejado, amadurecido ao longo de mais de 30 anos de experiências musicais muito diversas e de um troço mais importante que tudo, chamado vida — aquela mesma que, como escreveu Vinicius de Moraes, só se dá a quem se deu.
Após o anúncio do fim da dupla com sua irmã, em 2007, Junior teve tempo para viver.
Foi um tempo sob menos holofotes, de alegrias cotidianas e dores de crescimento, tempo também de terapia, casamento, paternidade e recomeços.
Este “Solo — Vol. 1” é o chão de onde ele se projeta para uma nova fase da carreira, a partir de composições trabalhadas desde 2020 e que ganharam forma no último trimestre de 2022, no estúdio No Santo Som, em Campinas.
De um total de 54 músicas, foram pinçadas dez para este primeiro volume. Outras onze (mais dois interlúdios) irão entrar em um segundo e futuro lançamento.
Jovem, mas com talento musical, carisma e habilidades performáticas provadas e comprovadas ao longo de décadas de carreira, Junior era — é — um sonho de consumo para qualquer diretor artístico ou executivo da indústria fonográfica.
mais destaque na faixa de abertura, o balanço “De Volta Pra Casa”, com baixo programado e baixo tocado — por Dudinha, velho companheiro desde os tempos de Soul Funk, a banda que Junior montou em 2005 para tocar covers no Na Mata Café, em São Paulo. O arranjo inclui viradonas que remetem ao hit “Easy Lover” (Phil Collins e Phillip Bailey), dos anos 80, feitas com rotontons míticos em uma Ludwig Vistalight (a bateria preferida de John Bonham, do Led Zeppelin).
Acostumado a co-produzir discos desde “Identidade” (2003), Junior assina a produção de todas as faixas do álbum junto com Felipe Vassão (de elogiados trabalhos de Emicida) e Lucs Romero. Ele não conhecia Vassão pessoalmente, mas os dois entraram em sintonia desde o primeiro almoço. “O cara curtiu todas as faixas que eu mostrei, não queria jogar nada fora. É mais louco que eu”, brinca Junior. Vassão indicou Romero, que já tinha chamado a atenção de Junior pelo trabalho com o Fresno. E a identificação foi imediata, a partir da paixão mútua pelo software de produção Ableton. “A gente se encontrou bem demais no processo. Todo mundo sabe trabalhar em equipe. Sem ego, sem julgamento. Sempre a favor do som, em prol da música”.
sensualidade R & B angustiada (“Ninguém é Santo”) e para duas canções com potencial para ficar no repertório de Junior por décadas. Ambas foram inspiradas pela paternidade, mas musicalmente seguem caminhos distintos — assim como as personalidades dos homenageados. “O Dom” é um épico para arrepiar arenas, presente de pai para filho de Xororó, que Junior soube complementar com sensibilidade em vocais arrojados, letra — endereçada ao pequeno Otto, seu filho mais velho — e arranjo (com belo trabalho de guitarra de Filipe Coimbra). Já “Novo Olhar”, docinho de timbres “oitenteira” embalado por synth bass e baixo “de verdade”, é uma declaração de amor para a filha Lara, mas também se presta a animadas playlists noturnas ou de corrida. Uma das possíveis leituras deste “Solo — Volume 1” passa por forças, afetos e talentos que atravessam gerações. “It’s a family affair” (“É um assunto de família”), diria um fã de soul music, emocionado, mas sem parar de dançar.
Pedro Só
ouça:
Junior – Solo – Volume 1
- De Volta Pra Casa (bibi, Mayra, Junior, Thalles Horovitz)
- Sou (Tony, Kleber, Junior, Xororó)
- Tentando Acertar (Barbara Dias, Thalles Horovitz, Jenni Mosello, Junior, Lucas Romero)
- Passar dos Danos (Lucas Nage, Jenni Mosello, Junior, Vitor Kley)
- Foda-se (Dani Black, Junior)
- Gatilho (Vivian Kuczynski, Barbara Dias, Lucas Nage, Jenni Mosello, Junior)
- Ninguém É Santo (Junior, Vivian Kuczynski, Barbara Dias, Filipe Toca, Felipe Vassão)
- O Dom (Tony, Kleber, Junior, Xororó)
- Novo Olhar (Junior, Thalles Horovitz, Felipe Vassão)
- Paraquedas (Jenni Mosello, Thalles Horovitz, Deco Martins, Junior)